sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Epíteto

A paisagem, em ocasiões específicas, nos permite confundir sobre e sob o horizonte o céu e a terra, respectivamente. Quando se deixa perder o olhar, e a vista embaçada e difusa não mais separa um do outro, é possível considerar como um (uno) aquilo que o olhar costuma separar tão categoricamente.

É a grande falha dos sentidos: a superficialidade. Nossa limitação sensorial é conhecida, isso não é novidade. A visão, fonte de maior conhecimento, é ingênua ou, pior ainda, dissimuladora. Ela nos dispersa do tangível, da realidade que ela supostamente retrata.

"O homem não nasceu para pensar". Esta é uma frase do livro "O Lobo da Estepe", do escritor alemão Herman Hesse. Segundo ele o homem não nasceu para exercer este dom, ele o faz por acaso. Descobre a capacidade e, depois de tal facticidade, perde-se. Está condenado a viver uma vida em constante fuga ou eterno retorno à condição de ignorante, um caminho sem volta...
No entanto, iganoramos uma outra condição: o homem não só é um ser não inclinado ao pensamento, ele é ainda menos inclinado aos sentimentos. Quanto mais próximo o ser humano é conduzido à sua condição animalesca, mais próximo dela as suas ações vão se dirigir.

Nada nos deixa mais perdidos, confusos e irritados do que as vicissitudes do "coração". Tudo nos desarma menos do que a vulnerabilidade do sentir. Essa incompetência natural, ignorada por uns, retratada intencionalmente por poucos, deve-se ao fato de que somos tão animais quanto podemos ser e mais do que acreditamos ou gostaríamos.

No final das contas, só tomamos conhecimento dessas limitações quando nossa visão distorce não o horizonte, mas a nós mesmos. Uma massa amórfica de células, órgãos, água, oxigêncio, sangue, osso e sentimentos.

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